sábado, 25 de abril de 2009

Erros de tradução

Tempos atrás, uma leitora (Rossana, autora do blog de ótimo conteúdo Professora de Escola Dominical) comentou sobre um erro de tradução (cf. na postagem Feliz Páscoa!):

“O tradutor não entendeu um paralelo que o autor quis fazer com a linguagem das escrituras e traduziu assim: ‘O medo do autor está no começo do conhecimento literário’, quando o autor disse: ‘O temor do autor é o princípio do conhecimento literário’.

O caso que ela apontou pode, de fato, indicar uma deficiência de conhecimento da temática do texto traduzido. Há, também, a famosa “falta de cultura geral” que, tendo em vista o amplo acesso a informações nos dias de hoje, pode ser chamada de “falta de incitativa de pesquisar”.

Outras vezes, a carência é de familiaridade com o tipo de texto e a linguagem usada. Um tradutor acostumado a trabalhar com textos voltados para leitores adultos, por exemplo, terá de redobrar a atenção e os esforços ao se propor a traduzir textos para um público leitor mais jovem (minha situação no momento).

Além das questões mencionadas acima e da causa mais óbvia de erros, a saber, a falta de conhecimento da língua de origem e/ou língua-alvo da tradução, outros elementos podem levar o tradutor a cometer equívocos de vários tipos. Alguns exemplos:

  • pressa (trabalhar com prazos curtos demais);
  • fazer várias coisas ao mesmo tempo (traduzir e navegar, traduzir e cuidar de um cônjuge, dois filhos, três bolos assando no forno e quatro gatos correndo pela casa);
  • distrações do ambiente (ruídos externos, televisão/música, os mesmos quatro gatos correndo pela casa);
  • cansaço físico, mental, emocional (tensão muscular, ausência de atividades diversas, preocupação com outros assuntos);
  • saturação devido a excesso de contato com o texto (especialmente no caso de projetos longos – o famoso familiarity breeds contempt).

E, por fim, convém lembrar que, apesar de ser saudável ter um olhar crítico e procurar aprender com os deslizes de outros (em outras palavras, ser criativo na hora de cometer os próprios erros e não repetir os alheios), é preciso muito cuidado para não desenvolver uma atitude excessivamente crítica. Claro que numa reunião de tradutores, revisores e outros “ores”, é impossível não trocar exemplos de “pérolas editoriais”, mas se nosso assunto é esse, talvez seja hora de aplicarmos à vida profissional um pouco daquilo que Jesus ensinou em Mateus 7.1-5:

“Não critiquem, e assim vocês não serão criticados! Porque como vocês tratam os outros, eles também vão tratar vocês. E por que se preocupar com um cisco no olho de um irmão, quando você tem uma tábua no seu próprio olho? [...] Fingido! Livre-se da tábua primeiro, assim você poderá enxergar para ajudar seu irmão”.

E em Mateus 5.7:

“Felizes os que são amáveis e têm misericórdia dos outros, porque a eles se mostrará misericórdia”.

Eis uma lição que preciso continuar a aprender...


Se você quiser saber mais sobre a dinâmica dos erros de tradução, confira abaixo alguns trechos de um artigo do site Erudit.org. Vale a pena ler o texto completo e usá-lo como referência para ver "a tábua em nosso olho".


Understanding Why Translators Make Mistakes

Candace Séguinot

[...]

Errors and the Individual

Limitations on Processing Capacity

The primary explanation why even competent translators make mistakes is because human cognitive processing capacity is limited. Because we can only attend to so much with our conscious processes, we automatize as much as possible to leave our minds free for more difficult tasks. That means that our attention is directed to only some

of the things we are doing at the same time.

A related constraint is the fact that there are limitations on short-term memory. The psychologist George Miller's famous article put it very nicely : « The magicical number seven, plus or minus two... ». We can organize our intake so the seven or so items in fact contain items themselves, for example storing words as opposed to single letters, but there is nonetheless a limit after which memory fades. In an observational study I reported on elsewhere (Séguinot, 1989) there is some indication that professional translators may develop strategies to deal with these limitations on memory. The translator observed in that study made different kinds of error in the first part

of sentences than towards the end of the sentences. The particular kinds of error indicate that the passage from the source text to the translation was probably through the memory of the content of the source text for the first part of the sentences, but clearly more from the surface of the source text as the translator's memory began to fade. When this happened, there were more examples of interference from

the source text, more literal translation or transcoding.

[...]

Parallel Processing and Forward Planning

The translation process is not a step-by-step linear progression. When we translate, we are actually performing a number of tasks at the same time. We monitor our output and tend to correct mechanical errors as they occur. We do not search for words one at a time, wait until the search is successful, then search for a new word. The psycholinguistic research suggests that the unconscious operations involved in producing language can simultaneously pursue different options.

Our comprehension of text is also non-linear in that we are constantly making predictions about what is ahead. We do this on the basis of educated guesses. The education comes in several forms: experiences stored in the form of scripts, scenarios, frames, schema, i.e. patterns, which include knowledge about types of texts, language

patterning, and content information about the way the world operates. There is also evidence in the video-taped observational studies that translators take less time making decisions about specific translation problems that recur as it becomes obvious that the same source language usage is being repeated with the same value. This leapfrogging

is a potential source of error when the world of the source text does not unfold as expected.

[...]

Motor Aspects of Production

The pragmatics of the working situation may affect the output. The translation is produced in some form : dictated, typed, or written in longhand. These forms of production require effort from specific muscle groups and a certain amount of attention to specific termination stages such as the end of lines or tapes or screens. The indications are that certain forms of production may be more likely to induce certain

kinds of error.

[...]

There are other obvious factors that lead to a multiplication of

errors : producing translations under severe time constraints, while performing other tasks that require undivided attention (like answering the phone), in the midst of external distractions or noise.

Conclusion

To conclude, there are errors which are associated with levels of competence, errors which arise because a translator does not understand the source language or manipulate the target language well enough, etc. But there are also errors that are a normal by-product of the translation process and errors that are normal in learning to translate.

These errors can help us understand what happens when translation goes wrong, and through our understanding of these lapses, the nature of the translation processes themselves.

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