quinta-feira, 22 de abril de 2010

Por que oramos uns pelos outros?


Como tradutor cristão, você tem o costume de orar por seus colegas de profissão? Tem contato frequente com outros tradutores que estão em busca de um relacionamento diário mais profundo com Deus? Em caso negativo, sente falta desse contato? Em caso afirmativo, que diferença ele faz em sua rotina?

Troco e-mails semanalmente com colegas cristãos da área editoral. Muitas vezes, falamos de trabalho. Em outras ocasiões, porém, falamos de coisas do coração e pedimos socorro de oração uns aos outros. Os prazos podem não encolher, o trabalho pode não render tanto quanto gostariamos, a disposição pode não se multiplicar, mas aprendemos coisas novas a respeito uns dos outros e, principalmente, a respeito do Deus a quem servimos e do qual dependemos em todas as coisas.


No texto abaixo, que preparei para os participantes do círculo de oração da nossa igreja, trato do papel da oração conjunta na comunidade dos cristãos.



Por que oramos uns pelos outros?

Por que compartilhamos pedidos com várias pessoas e até institucionalizamos essa prática na forma de correntes ou círculos de oração?

Deus é convencido por números? Quanto mais intercessores, maior a probabilidade de ele ouvir nossas petições? Quem sabe, dentre tantas pessoas, algumas são mais santas e terão mais facilidade em obter o favor de Deus... Correntes de oração constituem, então, uma forma de superstição cristã?


Consideremos dois pontos:


1. A Bíblia nos instrui a apresentar nossas petições ao Senhor e a orar uns pelos outros (cf. Gl 6.2; Fp 4.6; Tg 5.16).

2. A dinâmica do Corpo de Cristo envolve três dimensões relacionais:

  • A vertical individual, na qual cada indivíduo se relaciona com Deus e ele se revela a cada um.
  • A horizontal, na qual nos relacionamos uns com os outros e revelamos nosso ser interior uns aos outros.
  • A vertical comunitária, na qual nos relacionamos com Deus em conjunto e ele se revela a todo o Corpo.

Diante da instrução bíblica e dessas dimensões relacionais, pode-se dizer que a corrente de oração cumpre dois papéis: desenvolve a dimensão horizontal e estimula a dimensão vertical comunitária.

Quando pedimos que irmãos orem por nós, colocamos de lado nosso individualismo e orgulho e reconhecemos que fazemos parte de algo maior. Somos membros uns dos outros (Rm 12.5). Somos peregrinos que caminham juntos aqui na terra. A caminhada conjunta não é meramente conceitual e facultativa. É uma realidade a ser vivida. Daí, a instrução bíblica para orarmos uns pelos outros e levarmos as cargas uns dos outros.

Quando oramos por nossos irmãos, reconhecemos que Deus é nosso único Provedor. O alívio, conforto, satisfação e realização que a comunidade humana pode nos oferecer são reais, abençoados e abençoadores. Em função de sua própria natureza, porém, também são incompletos, imperfeitos e passageiros. Ao mesmo tempo em que aceitamos nossa dependência dos outros membros do Corpo, aprendemos a buscar a Deus juntos, pois não temos dentro de nós mesmos a substância necessária para suprir, de forma independente, as carências uns dos outros. Podemos ser canal de bênção, mas a fonte é sempre Deus.

O valor da corrente de oração não reside, portanto, no número de participantes nem no “grau de santidade” dos mesmos, mas sim, na vivência bíblica e nas dimensões relacionais que ela promove. É um instrumento de adoração e crescimento conjunto, e não um mecanismo mais eficaz do que a oração individual para obter as respostas que desejamos.


Oremos, portanto, uns pelos outros e, juntos, adoremos ao Senhor, buscando-o como nosso mais precioso bem.

“Digo ao SENHOR: Tu és o meu Senhor; outro bem não possuo, senão a ti somente” (Sl 16.2).


sexta-feira, 9 de abril de 2010

Caixa de ferramentas para tradutores

A lista de recursos on-line apresentada a seguir foi compilada por Fabiano Medeiros, do editorial da Ed. Mundo Cristão, com base em sugestões de vários tradutores. Many thanks ao Fabiano por autorizar a publicação dessas dicas tão úteis.


Você tem sugestões para acrescentar à lista? Deixe um comentário.


DICAS DE DICIONÁRIOS E FONTES DE CONSULTA

1. A primeira dica é a seguinte. Descobri por acaso... No Google, você digita a palavra ou expressão seguida de DIC. Ex: overwhelming DIC. O resultado são as definições fornecidas pelos dicionários mais importantes...

2. Para quem prefere algo mais profissional, basta acessar o www.onelook.com e digitar ali a palavra ou expressão. O Onelook é uma espécie de portal dos melhores dicionários online, técnicos ou não.

3. Alguns endereços específicos (eu mantenho o ícone dos melhores na minha barra do IE, para fácil acesso):

Monolíngues inglês

Cambridge

http://dictionary.cambridge.org/ (há uma versão americana também)

Chamo a atenção de vocês para este dicionário por ser altamente prático. Como veem no exemplo abaixo, a Cambrige criou esse negócio de “apor” uma ETIQUETA em versal logo no início do verbete, já indicando o(s vários) campo(s) semântico(s). Isso facilita muito a consulta, porque remete você para o contexto imediato em que está trabalhando e reduz a perda de tempo na consulta por significados. Claro que isso não é possível em todos os verbetes... E não é algo que resolve todos os problemas. Mas ajuda muito em muitos casos! Ex:

get was found in the Cambridge Advanced Learner's Dictionary at the entries listed below.

· get verb OBTAIN

· get verb REACH

· get verb BECOME ILL WITH

· get verb START TO BE

· get verb CAUSE

· get verb BE

· get verb MOVE

· get verb TRAVEL

· get verb DEAL WITH

· get verb HAVE CHANCE

· get verb UNDERSTAND/HEAR

· get verb PREPARE

· get verb PAY

· get verb CONFUSE

· get verb ANNOY

· get verb EMOTION

· get verb HIT

Longman

http://www.ldoceonline.com/

Excelente.

Oxford

http://www.askoxford.com/?view=uk

Excelente.

American Heritage Dictionary

http://education.yahoo.com/reference/dictionary/

Excelente.

Merriam-Webster

http://www.merriam-webster.com/

Outro grande nome, claro, ao lado de Cambridge, Oxford, Longman, Random House, American Heritage.

The Free Dictionary

http://www.thefreedictionary.com/

Eu gosto bastante deste, particularmente.

Dictionary.com

http://dictionary.reference.com/

Já conhecia, mas usava pouco. Foi o Robinson que chamou a minha atenção para o seu valor e utilidade, e de fato estou comprovando. Vale a pena! Outra coisa legal é que ele conta com um bom tesauro. É possível assim encontrar as palavras alistadas também por associação semântica o que facilita às vezes a compreensão do termo ou a percepção de seu uso e abrangência.

YourDictionary.com (inclui outros idiomas e áreas técnicas)

http://www.yourdictionary.com/

Answers.com

www.answers.com

Indicado por Renato Fleischner.

Urban Dictionary

http://www.urbandictionary.com/

Este, eu queria que vocês me ajudassem a avaliar. Parece se tratar de um dicionário open source (com participação do público internauta). Isso torna a fonte vulnerável a erros! Outro problema que quero ressaltar, antes de mais nada: o dicionário traz verbetes que refletem um uso atualíssimo da língua inglesa. Traz até mesmo coisas que não se encontram em dicionário algum online. Só que, junto também, vem todo tipo de palavra e expressão de baixo calão. É um dicionário que expressa a língua inglesa como ela é usada hoje nas ruas, nas cidades, nas famílias, nos relacionamentos. Mas já encontrei aí termos e expressões para traduções do Manning, p. ex., que não achei em nenhum outro lugar. A Susana Klassen também o utiliza e confirmou a validade que eu suspeitava que tivesse.

Schott's Vocabulary

http://schott.blogs.nytimes.com/

Do New York Times. Além de informativo é, por vezes, bastante divertido. Indicação de Susana Klassen.

Monolíngue português

Aulete Digital

http://www.auletedigital.com.br/

É preciso baixar na máquina para ter acesso. Uma vez na máquina, só funciona se a pessoa estiver plugada. Mas estou gostando muito dessa versão atualizada (em atualização) do gigante Caldas Aulete. Que acham?

O Caldas Aulete também possui uma versão somente online: http://aulete.uol.com.br/site.php?mdl=aulete_digital. (Indicação de Vanderson Moura.)

Michaelis

http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php

Indicação de Vanderson Moura.

Priberam

http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php

Indicação de Vanderson Moura.

Infopédia

http://www.infopedia.pt/

Indicação de Vanderson Moura.

VOLP online

http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=23

Indicação extraída do blog de Judson Canto.

Bilíngues inglês-português/português-inglês

Babylon

http://dicionario.babylon.com/inglês

Já usei mais no passado, mas é uma boa opção bilíngue (quem me relembrou foi a Silvia). Vou voltar a usar para me certificar de seu valor. Mas é uma marca já consagrada.

Word Reference

http://www.wordreference.com/

Ainda estou conhecendo, mas o diferencial aqui é que se trata de um bilíngue (com opções de outras línguas). Se usarem também, por favor ajudem a verificar se é mesmo bom.

Michaelis

http://michaelis.uol.com.br/

Não tão bom quanto o Webster’s inglês-português editado pelo Antônio Houaiss, mas quebra um galho bom até, né?

Im Translator

http://translation.paralink.com/#

Indicação de Vanderson Moura.

Reverso

http://dictionary.reverso.net/

Indicação de Vanderson Moura.

Sensagent

http://dictionnaire.sensagent.com/

Indicação de Vanderson Moura.

ECTACO

http://www.ectaco.com/online-dictionary/

Indicação de Vanderson Moura.

Lingoes

http://www.lingoes.net/

Indicação de Vanderson Moura. (“Descarrega-se o programa em si e também os módulos desejados; a quantidade de dicionários disponíveis é enorme, bastante abrangente.”)

Everest

http://www.free-soft.ro/index-en.html

Indicação de Vanderson Moura. (“Parece o genérico tosco do Babylon. Porém, mesmo carecendo de mais cuidado em sua elaboração, seu dicionário inglês-português é surpreendente.”)

Dicionários por especialidade

The Phrase Finder

http://www.phrases.org.uk/index.html

Ainda estou conhecendo, mas já me quebrou alguns galhos...

Online Etymology Dictionary

http://www.etymonline.com/

Já me quebrou galhos.

Dictionary of difficult words

http://www.talktalk.co.uk/reference/dictionaries/difficultwords/

Sugestão de Susana Klassen.

Corpus (indicações de Robinson Malkomes)

WebCorp Live

http://www.webcorp.org.uk/

Não um dicionário, mas uma ferramenta de pesquisa que mostra o termo ou expressão pesquisado em seu contexto em inúmeras páginas da internet. É como um Google mais focado na questão linguística. Seria um levantamento da ocorrência do termo ou expressão no “corpus” da internet (?). O Robinson poderá definir isso melhor. Bem, é um recurso ótimo para quem escreve em inglês, como os tesauros. Mas também auxilia muito na compreensão de palavras e expressões, uma vez que as vemos em uso no contexto, em uma infinidade de situações. Facilita para captarmos o sentido mais pleno, ou os diferentes sentidos, ou os usos variados do termo em questão.

Corpus of Contemporary American English (COCA)

http://www.americancorpus.org/

Coletado de fontes diversas publicadas entre 1990 e 2009, é o mais recente à disposição na Internet. São 400 milhões de palavras. Traz um interessante corpus de palavras usadas entre 1920 e 2000 pela TIME (com 100 milhões de entradas!). É atualizado quase semestralmente (a cada período de 6 a 9 meses).

British National Corpus (BNC)

http://www.natcorp.ox.ac.uk/corpus/index.xml

Contém 100 milhões de palavras usadas no inglês britânico em fontes publicadas do final do século 20 até 2007. Fontes incluem "extracts from regional and national newspapers, specialist periodicals and journals for all ages and interests, academic books and popular fiction, published and unpublished letters and memoranda, school and university essays, among many other kinds of text".

Corpus eletrônico da USP

http://www.fflch.usp.br/dlm/comet/

A USP está trabalhando com um corpus eletrônico bastante abrangente (Português-Inglês) que tem por objetivo servir de suporte a pesquisas linguísticas, principalmente nas áreas de tradução, terminologia e ensino de línguas.A primeira versão ficou disponível em outubro de 2009 na rede. Mas ainda está em desenvolvimento. Vale a pena acompanhar.

Memória de tradução

MyMemory

http://mymemory.translated.net/

Uma ferramenta fantástica! Trata-se na verdade de um lugar na Internet para onde diferentes tradutores uparam suas memórias de tradução. Então, você seleciona língua de saída e de chegada, digita o termo ou expressão e encontra todas as traduções (no contexto) que foram upadas por diferentes tradutores com aquele termo ou expressão. O resultado vem assim... ex.:

That is wishful thinking. Isso é confundir os desejos com a realidade.

Everything else is wishful thinking. Tudo o resto são sonhos de uma noite de Verão.

In these circumstances, preparing for Congo 's reconstruction is wishful thinking. Nas circunstâncias actuais, a preparação da reconstrução da República Democrática do Congo não passa de um wishfull thinking.

E assim por diante... Vai ter todo tipo de coisa, aproveitável ou não. Mas é muito legal.

Só que parece que o recurso é de Portugal; então, se encontra muita tradução com um português lusitano. Ora, pois!

Bíblia

Bible Gateway

http://www.biblegateway.com/

É possível ler um texto ou livro bíblico em várias versões e em alguns idiomas.

http://www.bibliaonline.net/acessar.cgi?pagina=avancada
Indicado por Cecília Eller. É possível digitar uma passagem e lê-la ao mesmo tempo nas versões RA, NVI e NTLH.

http://bibliaonline.com.br/
Indicado por Cecília Eller. Traz a RA, a RC e a Corrigida e Revisada fiel.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Páscoa


Deus, porém, é tão rico em misericórdia! Ele nos amou tanto, que embora estivéssemos espiritualmente mortos e condenados pelos nossos pecados, Ele nos deu de volta a nossa vida quando levantou Cristo dentre os mortos - somente por sua misericórdia imerecida é que fomos salvos - e nos levantou da sepultura para a glória juntamente com Cristo [...] tudo por causa daquilo que Cristo Jesus fez [...]

A salvação não é uma recompensa pelo bem que fizemos, portanto nenhum de nós pode obter qualquer mérito por isto. Foi o próprio Deus quem fez de nós o que somos e nos deu uma vida nova da parte de Cristo Jesus [...]

Agora, porém, vocês pertencem a Cristo Jesus e, ainda que antigamente estivessem muito longe de Deus, agora foram trazidos para muito perto dele por causa daquilo que Jesus Cristo fez por vocês com o seu sangue.
Efésios 2.4-13 (Bíblia Viva)

Que os próximos dias sejam um tempo de reflexão séria acerca da morte que merecíamos e de comemoração alegre pela vida que recebemos por meio do sacrifício e ressurreição de Cristo.

Feliz Páscoa!



Imagens: Cemitério da Recoleta - Buenos Aires / Isla Bridges - Ushuaia

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

A medida do Natal



Como você mede seu sucesso, qualidade de vida e felicidade?

( ) Pela quantidade de coisas boas que fiz por outros e por minha contribuição à sociedade.

( ) Pelo saldo na conta corrente.

( ) Pela quantidade de diplomas na parede, livros na estante ou carimbos no passaporte.

( ) Pelo número no mostrador da balança.

( ) Pela quantidade de árvores que salvei, água que economizei e lixo que reciclei.

( ) Pelo número de horas de lazer e entretenimento que desfrutei com família e amigos.

Por mais importantes que sejam alguns desses indicadores, o Natal nos convida a pensar em outras medidas: a largura, comprimento, altura e profundidade do amor de Cristo que excede todo conhecimento (Efésios 3.18).
Jesus veio ao mundo para nos dar uma vida nova, a ser dimensionada de acordo com novos parâmetros. Veio nos oferecer um amor que preenche generosamente os vazios, nos liberta da tirania dos resultados e abre nossos olhos para as implicações eternas de tudo que fazemos.


Que seu Natal seja verdadeiramente feliz e que cada dia de 2010 lhe proporcione um pouco mais de compreensão do amor imensurável de Cristo!

sábado, 10 de outubro de 2009

Valores pessoais ou preço por lauda: a escolha do texto


Quando se fala em tradução, valores e crenças, é comum ouvir perguntas como: “O profissional cristão pode traduzir um texto ... (budista, espírita, erótico, violento, etc.)?”. Se “pode” tem o sentido de “é capaz”, a resposta depende da competência do profissional. Um bom tradutor de textos literários, por exemplo, deve ser capaz de traduzir com precisão e fluência cenas de violência extrema descritas em uma obra de ficção. Se, contudo, “pode” tem o sentido de “é legítimo”, a resposta se torna mais complexa, pois depende da consciência do profissional. Um profissional que coloca seus valores pessoais acima do preço por lauda, com certeza vai pensar duas vezes antes de traduzir um texto contrário às suas crenças, sejam elas de ordem religiosa, política, moral ou de qualquer outro tipo. Um tradutor pacifista, por exemplo, irá, no mínimo, hesitar em traduzir um texto que promova o uso de armas, não obstante quanto lhe ofereçam pelo serviço.

Trago o assunto à baila não apenas por exercício teórico. Tenho refletido sobre isso com respeito ao meu trabalho nos últimos dias. Não fui contatada por uma editora de contos eróticos, nem tampouco por um periódico da Cientologia. Creio que teria sido mais fácil lidar com propostas desse tipo.

No caso em questão, a editora cristã X para a qual trabalho há vários anos enviou obra Y de autor Z.

Pontos a considerar:


a) Autor Z é o best-seller da casa, de modo que, como tradutora, sinto-me honrada por receber o trabalho.

b) Não tenho problemas com a linha geral da editora X, respeito e admiro muitos de seus profissionais e aprecio a cultura de trabalho do departamento editorial.

c) Em termos de ideologia/teologia, obra Y não é diferente de obras anteriores do autor Z.

d) Obra Y trata de questões importantes e apresenta alguns pontos positivos. Incentiva, porém, práticas que, a meu ver, se baseiam em distorções teológicas que podem exercer influência negativa sobre os leitores.

e) Já traduzi diversas obras de autor Z e deparei com o mesmo dilema, mas decidi varrê-lo para debaixo do mouse pad e não pensar no assunto.

f) Minha consciência tem me incomodado mais do que em ocasiões passadas. Até quando desejo continuar participando da propagação de uma mensagem que me parece não apenas inócua, mas, em alguns pontos, nociva?

g) Em contrapartida (e aí reside o dilema), se começar a recusar trabalhos por não concordar com a linha do autor em certos pontos da obra, creio que em breve estarei sem serviço, pois é praticamente impossível concordar com 100% daquilo que se lê em qualquer área. Ademais, não quero me transformar em uma daquelas tradutoras com ares de prima donna que exigem trezentas rosas brancas e vinte caixas de chocolate Godiva no camarim para trabalhar.

h) É importante ressaltar que não se trata apenas do medo de “perder serviços”, pois creio que editora X não deixaria de mandar trabalho se eu recusasse autor Z. Os medos são mais profundos e envolvem minha suposta reputação (como os outros me verão se eu fizer isto ou aquilo) e senso de compromisso e responsabilidade em relação aos profissionais da editora em questão.


Não escrevo para dizer que encontrei a solução para o dilema, mas para ventilar as possibilidades que consigo vislumbrar no momento:


a) Posso colocar a questão dentro da gaveta outra vez e aguardar seu reaparecimento quando a editora X solicitar outra tradução de autor Z.

b) Posso conversar com editora X e dizer que, no futuro, prefiro não traduzir textos de autor Z.

c) Posso continuar a orar e pedir sabedoria e discernimento. Em minha opinião, esta alternativa não é igual à alternativa (a), pois implica possibilidades que talvez eu não esteja enxergando no momento.


Na verdade, o dilema envolvendo a sopa de letrinhas acima é apenas um reflexo de outros questionamentos em relação ao modo como devo me posicionar em relação às realidades ao nosso redor. Graças a Deus, nenhum desses questionamentos é novidade e sei que, ao levantá-los, ando na companhia de santos de todas as eras. Ainda assim, cada um de nós precisa lidar com eles em situações de diferentes magnitudes e com diferentes implicações.

Tenho meditado sobre o primeiro capítulo de Daniel, onde o jovem cativo aceita aprender a cultura e ciência dos caldeus (provavelmente contrária às suas crenças em diversos aspectos), mas recusa seguir sua dieta. Como descendente de menonitas que viviam em colônias isoladas do restante da sociedade pecadora, também me pareceu bastante oportuno um artigo publicado recentemente no site da Christianity Today, que mostra duas maneiras de interagirmos com aquilo que entra em conflito com nossas crenças (quer no “mundo secular” ou no “mundo cristão”).


Descanso na promessa viva e real de Tiago 1:5: “Se, porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida”. A solução mais prática, como sempre, é voltar Àquele que sabe todas as coisas, inclusive os efeitos reais (positivos ou negativos) dos textos que escolho traduzir e seu lugar nos propósitos mais amplos da história da redenção, uma história na qual todos nós temos um papel.

sábado, 27 de junho de 2009

Um modo diferente de ler

Para quem trabalha em contato direto com textos o dia todo, a leitura tem funções claras: apreender a ideia mais ampla; entender o significado da unidade conceitual básica, quer seja o parágrafo, a frase ou a palavra; pensar a ideia da língua original na língua alvo; reestruturá-la na língua alvo; reler e verificar a compreensibilidade; buscar e corrigir erros de vários tipos e por aí afora.

Como parte fundamental de nosso ofício, a leitura é pragmática e, muitas vezes, feita sob a pressão do tempo, do desempenho e das cobranças pessoais e alheias, quer por necessidade ou contingência. Distanciamo-nos do texto e o observamos com olhar crítico para encontrar e eliminar suas fraquezas. É desse processo que nascem as obras claras, precisas, prazerosas de ler.

Quando lemos nos momentos de lazer, nos posicionamos diante do texto com menos pressões e, talvez, mais expectativas. Queremos que ele nos informe, entretenha, descanse, emocione, transporte para outros universos, conduza à reflexão e formação de novos conceitos. Ainda assim, muitas vezes, é inevitável detectar erros, pensar em como teríamos feito diferente, sentir uma medida de frustração pelo modo como o autor se expressou ou pelas escolhas do tradutor.

Tamanho é o poder da palavra escrita que Deus escolheu se revelar por meio dela. Qual deve ser, então, nossa abordagem diante da revelação divina em forma de texto? Deve assemelhar-se à postura que assumimos como profissionais ou como leitores e interessados? As respostas dependem do objetivo. Podemos ler a Bíblia por vários motivos, inclusive para encontrar erros, incoerências e pontos fracos, como fazem muitos. Podemos vê-la como livro de estudos, manual de instruções, relato histórico, literatura antiga, etc. Quem trabalha nos meios editoriais cristãos, muitas vezes tem contato diário com as Escrituras como texto-base para comentários bíblicos, livros de teologia e afins.

Para captar sua essência revelacional, porém, não podemos ser apenas pragmáticos ou curiosos, analíticos ou interessados.

Por ser a revelação do Ser divino, o texto bíblico exige aquilo que nenhum outro texto tem o direito de exigir: reverência, humildade, sujeição, obediência (termos que nem sempre agradam muito nossa mente pós-moderna). Em contrapartida, proporciona aquilo que nem as maiores obras-primas da literatura podem proporcionar, a saber, conhecimento verdadeiro e relacionamento com o Deus que criou e controla todas as coisas, com o Deus que oferece a eternidade ao lado dele para ampliar esse conhecimento e desenvolver esse relacionamento.

Diante disso tudo, há momentos em que precisamos colocar de lado todas as formas de leitura às quais estamos habituados e adotar um modo diferente de ler: a lectio divina.

Apesar de ser associada hoje em dia à vida monástica ou aos que adotam um estilo mais contemplativo a arte de “orar as Escrituras” era prática comum de quase todos os cristãos da antiguidade. É o que diz Luke Dysinger em sua descrição dos passos dessa forma de leitura: Accepting the Embrace of God: The Ancient Art of Lectio Divina. O texto (em inglês) é relativamente curto e apresenta com clareza quatro movimentos da leitura espiritual, que é como Eugene Peterson chama o exercício em seu livro Maravilhosa Bíblia (trad. Neyd Siqueira; Mundo Cristão, 2008).

Os movimentos são:

Lectio – Ouvir / ler o texto bíblico profundamente com todo nosso ser. Assumir uma postura de reverência e atenção em busca da palavra que Deus quer destacar para nós naquele momento.

Meditatio – Ao encontrar a palavra ou expressão que mais nos chama a atenção, devemos fazer uma pausa para “ruminar” a seu respeito, guardá-la e meditar no coração (Lucas 2.19). Por meio da meditação, permitimos que a palavra de Deus nos toque nos níveis mais profundos.

Oratio – O terceiro passo é o diálogo com Deus no qual não apenas dizemos a ele o que entendemos e como sua palavra nos tocou, mas também nos aquietamos para continuar a ouvi-lo falar. Consagramo-nos a ele e pedimos que nos ajude a aplicar a palavra.

Contemplatio – Por fim, simplesmente descansamos na presença Daquele nos convidou para esse relacionamento por meio de Cristo e, deixando todas as palavras para trás, nos aquietamos e desfrutamos sua presença.

A consequência dos quatro passos acima é Actio – a palavra se reflitirá em nossas ações e atitudes e trará mudanças reais e visíveis em todos os âmbitos, inclusive o profissional.

Converse com Deus sobre a forma como você lê a palavra de revelação. Ele criou a linguagem e a capacidade humana de compreendê-la. Ele nos convida a um relacionamento profundo por meio da comunicação escrita, mas, como sempre, também nos chama para algo que vai muito além. Da próxima vez que você fizer uma pausa para ler o texto mais importante de todos, não o faça apenas como editor, tradutor, revisor ou leitor interessado. Aproxime-se da palavra como filho que volta ao Pai, como criatura que adora ao Criador, como remido que deseja conhecer Aquele com quem os salvos vão passar a eternidade.

Boa leitura!

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Mãos


Mãos que digitam com rapidez, que clicam centenas de vezes por dia, que seguram a caneta vermelha.
Mãos que trabalham para consturir pontes de papel e tinta e unir culturas.
Mãos doloridas e cansadas no final da semana.

Mãos que precisam aprender a descansar.
Mãos cujas forças são renovadas a cada manhã.
Mãos que procuram outras mãos para traduzir em gestos o amor, a amizade, o apoio, o perdão.
Mãos formadas por Mãos Divinas muito maiores e mais fortes.

Mãos que podem esperar serenas o dia em que serão aperfeiçoadas para sempre.


Imagem: Borboleta descansa sobre minha mão (por Vanderlei Ortigoza Jr.; março/2009)

Para quem trabalhamos?



Sugiro para reflexão e, com a ajuda de Deus, aplicação, alguns trechos de mais um excelente livro de Dallas Willard: A conspiração divina (trad. Eduardo Pereira e Ferreira; Ed. Mundo Cristão, 2001).


Capítulo 8 – De como ser discípulo, ou aluno, de Jesus


A glória do meu trabalho


[...] Pense no seu trabalho, aquilo que você faz para viver. Essa é uma das maneiras mais claras de se concentrar na sua condição de discípulo de Jesus. Ser discípulo de Jesus é, essencialmente, aprender com Jesus a fazer o seu trabalho como o próprio Jesus o faria. O Novo Testamento exprime essa ideia propondo que tudo façamos “em nome de” Jesus.

Quando você pára para pensar nisso, percebe que não encarar o trabalho como local primordial de exercício do discipulado é excluir automaticamente a parte principal, se não a maior, das horas ativas da vida com Jesus. É aceitar controlar sozinho um dos seus interesses mais fortes na vida [...]


Mas como é exatamente que se faz do trabalho um aspecto essencial da condição de discípulo de Jesus? Obviamente não se tornando um cristão “chato”, o rigoroso defensor de toda decência e crítico acerbo da conduta de outros. [...]


A mansa mas firme não-cooperação com coisas que todos sabem ser erradas, aliada a um serviço sensível, não impertinente, não intrometido, não subserviente aos outros, deve ser o nosso modo habitual e declarado de agir. Isso se deve combinar com uma constante vida íntima de oração por todo tipo de atividade que o nosso trabalho exige, além de um amor genuíno por todas as pessoas envolvidas.

Assim, pontos específicos dos ensinamentos e do exemplo de Jesus – como a não-retaliação, a recusa de pressionar por vantagens financeiras [...] entrarão em ação de acordo com as circunstâncias. [...]


[...] o interesse central de Deus é o trabalho específico das pessoas [...] Ele quer o trabalho bem feito. É trabalho que precisa ser feito, e deve ser feito como o próprio Jesus o faria. Nada substitui isso. Na minha opinião, pelo menos, enquanto a pessoa está trabalhando, todas as atividades exclusivamente religiosas devem assumir um posto secundário em relação à obrigação de fazer “o serviço” com suor, inteligência e o poder de Deus. Essa é a nossa devoção a Deus. (Estou supondo, claro, que esse trabalho promove os bons propósitos humanos.) [...]


Como aprendizes de Jesus, relacionamo-nos pessoalmente com ele ao fazer o nosso trabalho, e ele está conosco, como prometeu, para nos ensinar a fazer o melhor.

[...] se você não gosta do seu trabalho, ou até o odeia, condição epidêmica na nossa sociedade, a maneira mais rápida de se livrar dele, ou de nele encontrar alegria, é fazê-lo como Jesus o faria. Isso é o próprio âmago do discipulado, e não podemos ser aprendizes competentes de Jesus sem integrar o nosso trabalho ao Reino no Meio de nós.